O Exército Balmain
Algo de extremamente poderoso paira sobre as campanhas de marketing de moda que, mais do que sugerir o que vestir, promovem estilos de vida. Seja através das poses de bloggers de moda, que trazem peças de designer das passerelles para o aclamado streetstyle, tornando-as aparentemente acessíveis ao consumidor comum; ou através de parcerias para a criação de colecções de carácter limitado, onde os preços por peça descem, tornando-se mais acessíveis do que nas casas de alta-costura, sem perder o seu luxuoso sine qua non.
Recentemente, e como prática comum ao longo dos últimos anos entre grandes marcas, a H&M lançou, em parceira com a marca parisiense Balmain, uma colecção exclusiva e limitada de mais de 100 peças de designer.
A marca de alta-costura, por muitos desejada mas limitada à carteira de apenas alguns, em conjunto com a cadeia de fast-fashion H&M, anunciaram a colecção com cerca de 6 meses de antecedência. Durante esse tempo, foram lançadas campanhas publicitárias embrionárias, que iam relembrando o público que em breve poderiam ter acesso à ainda misteriosa colecção. Eventos como a Fashion Week faziam prever que tipo de peças ficariam disponíveis em Novembro, vestindo celebridades como Alexa Chung ou Kendall Jenner, esta última uma das caras dos anúncios publicitários, a quem as pessoas iriam poder “roubar o look”. Criaram-se hashtags e o buzz à volta da Balmain Nation foi crescendo.
Estas práticas, cada vez mais utilizadas, de ir introduzindo pequenos lugares-comuns até ao lançamento oficial das colecções, ajudam a incutir a ansiedade necessária entre aqueles que correrão para as lojas, de modo a agarrar aquela peça de designer exclusiva antes que esgote. Este sentimento de ansiedade é obviamente construído tendo em mente a promoção da marca e o seu culto.
Esta parceria tem sido promovida em todo o mundo e a influência do social media teve um papel preponderante na sua disseminação. Quanto mais, melhor, certo? A rede ficou inundada de louvores à parceria, precedidos de um cardinal agregador de emoções digitais.
Ao criar um número limitado de peças à volta das quais emerge uma certa devoção, as marcas conseguem criar exércitos cegos de consumidores ávidos e ansiosos de deitar mãos às peças que viram e desejaram durante meses. No final, resta-nos fazer as contas: 50 peças não serão suficientes para responder à louca procura dos 500 clientes que irrompem pela loja dentro. Isto significa guerra.
Na última quinta-feira (5.11.2015), dia de lançamento da colecção Balmain x H&M, as lojas da H&M foram literalmente invadidas pelo impulsionado #balmainarmy. A tensão que se conseguia perceber ao longo da fila, do lado de lá das paredes de vidro da loja, traduziu-se mais tarde, aquando da sua abertura ao público, em pessoas que partiram estantes, caíram no chão e chegaram mesmo a lutar para conseguir trazer o blazer com aplicações para casa.
Na loja do Chiado, em Lisboa, o staff usou um pequeno sino prateado para fazer entrar os clientes ansiosos e usou pulseiras coloridas para os dividir por turnos e ajudar a controlar a loucura que se vivia, limitando o tempo de permanência na zona Balmain, restrita por grades, a apenas meros minutos. Além disso, uma pessoa não estava autorizada a comprar mais do que uma quantidade da mesma peça. Para contornar esta limitação, foram encontradas algumas alternativas, como o exemplo de uma família que passou a noite na fila para conseguir entrar em primeiro lugar e levar literalmente uma de cada peça da esperada colecção para casa. Ao fim do dia, já muitas peças se encontravam à venda no eBay ou no OLX por preços absurdos.
Loucura, febre, um novo tipo de desporto? Qualquer que seja a opção certamente eleva os níveis de adrenalina, como se de uma competição se tratasse, em que o vencedor tem direito a uma ovação de pé, por parte dos apoiantes, e olhares mortíferos dos restantes invejosos. Uma necessidade sem dúvida primitiva, de se sentir aceite e, até mesmo, poderoso. Qualquer um é capaz de se sentir poderoso ao ter acesso àquilo que a maioria não consegue atingir. Mas, até quando?
O carácter insustentável normalmente associado à fast-fashion e ao consumismo desmedido diz respeito não apenas aos materiais e ao ambiente, mas também às satisfações e emoções humanas. Mesmo que as marcas continuem a criar este tipo de necessidades, existe um limite para o que pode ser totalmente preenchido e satisfeito.
Da sua parte, qual será a resposta para quando ouvir o chamamento para se juntar ao exército?
Escolha a revolução, a Fashion Revolution.