No Dia Mundial da Água, o grito popular é por um serviço público e de qualidade para todos

By Fashion Revolution

2 years ago

Frente à possível privatização de empresas de água em São Paulo, população pressiona por direitos frente à Alesp

O grito de movimentos sociais frente à Alesp (Assembleia Legislativa de São Paulo) no Dia Mundial da Água foi muito claro: “água é um direito humano, não mercadoria”. A manifestação é apenas um dos atos espalhados pelo país, pressionando por um serviço público e de qualidade, em especial para aqueles que, até hoje, sofrem com falta de água potável e coleta e tratamento de esgoto. 

A data é simbólica pós-eventos climáticos extremos que levaram a água para debate público. As fortes chuvas ocorridas no último mês na cidade de São Paulo, no litoral do estado, em Manaus e no Maranhão foram alguns dos destaques dos noticiários e põem em evidência a necessidade de ações políticas para a contenção da crise climática e proteção da população mais vulnerável. É ela que tem direitos básicos, como o acesso à água potável e energia, mais comprometidos. 

O impacto da privatização dos serviços de água e saneamento básico é visto por manifestantes como um caso de racismo ambiental. “Existe uma questão histórica da falta de saneamento básico que engloba a questão do racismo estrutural”, explica Tamires Cruz de Paula, Coordenadora do MAB (Movimento de Atingidos por Barragens) do Estado de São Paulo, “historicamente, o serviço exclui a população preta, em especial as mulheres pretas e pardas que vivem em áreas de risco, como várzeas, encostas, áreas que são extremamente insalubres para a vida das pessoas”.

Tamires também explica que privatizar um serviço público que é essencial, no caso da água e energia, é tirar da população o poder de participação, construção e cobrança da melhoria desse serviço. “Quando ela sai do da mão do poder público, ela vai diretamente para as empresas privadas e geralmente de capital internacional. Deixa de ter um diálogo com a população, deixa de estar dentro dos órgãos regulamentadores, então, a gente perde totalmente o controle de cobrança”, afirma.

É por isso que o MAB tem o grito de guerra “água e energia não são mercadorias”, pois, segundo a coordenadora, “a partir do momento que você tira a água, um direito do povo, e joga para o mercado, tanto a população quanto o governo perdem o controle sobre ela”. Segundo um levantamento da UERJ (Universidade do Estado do Rio de Janeiro), o principal motivo para a reestatização da água em território brasileiro é tido como: tarifas altas, falta de transparência, valores excessivos pagos aos executivos”. 

O documento ainda destaca o estudo do Instituto Mais Democracia, “Quem são os proprietários do Saneamento no Brasil?”, que aponta que 58% dos grupos atuantes no setor possuem fundos de investimento e instituições financeiras entre seus controladores e 27% das empresas possuem capital estrangeiro. É válido lembrar casos no qual a privatização da água trouxe danos negativos tantos para a população quanto para o poder público, como o caso da cidade de Itu, que após 10 anos de privatização, a CIS (Companhia Ituana de Saneamento) voltou às mãos públicas com alegação de que os investimentos na ampliação da oferta de água potável não estavam sendo cumpridos. 

Já no Rio de Janeiro, a população está recebendo uma conta de água 71% mais cara que em São Paulo, desde que o governo estadual privatizou a Cedae (Companhia Estadual de Águas e Esgotos do Rio de Janeiro). A privatização da água na Bolívia, Chile. Manaus e Tocantins também demonstram a ineficiência da ação. A CUT (Central Única dos Trabalhadores) relembra que a aprovação do Marco Legal do Saneamento (Lei Federal 14.026/2020) abriu caminho para que as empresas do setor fossem privatizadas. 

Água para o Futuro

A Conferência sobre a Água da ONU (Organização das Nações Unidas) reuniu chefes de estados, ministros, altos funcionários governamentais e mais de 6,5 mil representantes da sociedade civil para discutir, entre 22 a 24 de março, uma nova agenda de ações para água dentro dos ODS (Objetivos para o Desenvolvimento Sustentável) das Nações Unidas, em especial para o objetivo 6 – água potável e saneamento básico. O alerta principal foi o “risco iminente” de escassez de água em nível global, devido ao consumo excessivo e à crise climática. 

Os dados apresentados já mostram que, em nível global, cerca de 2 bilhões de pessoas não têm água potável de qualidade e 3,6 bilhões não têm acesso a saneamento básico. As secas prolongadas, causadas pelo aumento da temperatura do globo, devem afetar não só as pessoas, mas também a biodiversidade. Segundo o relatório, a mercantilização “vai inviabilizar a realização dos compromissos e dificultar os esforços para resolver a crise global de água”.

Ainda nesta linha, o documento afirma que “é hora de parar com a abordagem tecnocráta da água e considerar as ideias, os conhecimentos e as soluções dos povos indígenas e comunidades locais que conhecem os ecossistemas aquáticos locais para garantir a sustentabilidade da agenda da água”. Tal discurso se alinha com as investidas da sociedade civil para a preservação do serviço de água e saneamento básico aqui, no Brasil. 

De volta à ALESP, Tamires pondera soluções para a melhoria do serviço de saneamento básico: “existem milhares de políticas, mas a principal é que se crie uma política de direitos e de proteção à população mais de baixa renda seja construída junto dela”. E esse diálogo deve ser feito entendendo as necessidades de cada local, pois cada região tem suas especificidades que não seriam contempladas em uma lei geral. “É necessário criar uma política junto com a população”, reforça. 

Durante a Celebração ao Dia Mundial da Água, a ANA (Agência Nacional de Águas) e a Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT) assinaram um protocolo para desenvolver normativas para a gestão hídrica, qualidade da água, saneamento básico, segurança de barragens, gestão de efluentes e resíduos em bacias hidrográficas. A norma técnica ABNT NBR 17080 tratá diretrizes para elaboração, implementação e avaliação de planos de segurança de água para assegurar o fornecimento de água segura e potável. No evento, também houve o lançamento do Pacto pela Governança da Água, que estimula a parceria entre a ANA e governos estaduais e distrital. O evento pode ser conferido no canal do Youtube