JAPÃO & A REGENERAÇÃO
O Japão como lente para a introdução às economias regenerativas
por Paula Costa
Você já esteve em um planetário? Esta viagem pela lente da astronomia é uma das recordações mais marcantes da minha adolescência, quando estive na Fundação CEU (Centro de Estudos do Universo), em Brotas – SP, durante uma excursão escolar. Revisitei esta memória recentemente, passando pelo Observatório Grinffith em Los Angeles, na Califórnia. Me dei conta de que o mesmo universo que naveguei há anos, estava ali, novamente explorando. Da mesma forma, há milhares de anos, este mesmo universo é estudado por diferentes povos e em diferentes lugares. Egípcios, maias, astecas, gregos, romanos, etc… Todo grupo de civilização carrega em sua história aprendizados e evolução a partir da observação do céu, incluindo os povos originais do Brasil, os indígenas, que desenvolveram uma sabedoria preciosa em relação aos movimentos da lua, do sol, das estrelas, e assim por diante, para a evolução da sobrevivência.
“A sabedoria não grita, nem sussurra. É uma ressonância que realinha você com a melhor direção, é um conhecimento que surge com clareza inegável, é uma expansão que torna a mente mais leve. A sabedoria é gradual, que muitas vezes mostra a mesma verdade através de diferentes ângulos, até que finalmente te atinge tão profundamente, que passa a se tornar parte do seu ser. À medida em que a sabedoria dentro de você amadurece, fica mais fácil deixar ir, parar de lutar contra si e mover-se junto com a natureza ao invés de contra ela.” – tradução livre do trecho de um livro de Diego Perez, que recebi da inquieta Fabiana Mortari justamente no momento em que vivia a experiência do planetário comentada acima.”
Falar sobre sobrevivência neste contexto é maravilhoso, porque a inquietude por trás da investigação do universo diz sobre a curiosidade de saber quem somos, de onde viemos e para onde vamos e é justamente esta soma de perguntas, que não deixa de ser uma grande busca por autoconhecimento, que nos trouxe até aqui e vai continuar nos levando adiante, nutrindo a sobrevivência.
A “arte de perguntar” tem relação direta com a evolução e com a sobrevivência
E é o que move os maiores pesquisadores práticos do universo, os astronautas. Estes protagonistas estão cada vez mais próximos, ocupando palcos de eventos de inovação para compartilhar fórmulas de suas jornadas de descobertas em explorações espaciais, e uma coisa sempre me chama a atenção: entre diferentes perspectivas, muitos destes profissionais se orientam às preocupações com a sustentabilidade depois de visitarem o espaço e avistarem o planeta Terra à distância.
“Quando olhei o nosso planeta do espaço, enxerguei a sua beleza e fragilidade e isso despertou em mim a necessidade de proteger e preservar ele para as próximas gerações” – foi o que declarou a astronauta japonesa Naoko Yamazaki durante o evento South by Southwest em 2021. Mais tarde, em 2023, neste mesmo festival de criatividade, ouvi a astronauta americana Sian Proctor falando algo como “a primeira vez que vi a ‘Earth light’ senti um profundo senso de pertencimento”, também fazendo referência ao chamado de cuidado com o planeta, compreendendo que a Terra não é somente um lar, um espaço que ocupamos, mas parte de nós. Esta conclusão chega no fato de que cada um de nós, parte viva da Terra, estamos profundamente conectados em uma interdependência muitas vezes invisível.
O pertencimento precisa se tornar visível para continuarmos inovando
É o que afirmo cada vez que conheço um novo lugar do mundo e realizo que entre as milhares de diferenças e culturas, por fim, somos todos um e iguais na essência.
“O cosmos está dentro de nós. Somos feitos de matéria estelar. Somos uma forma do universo conhecer a si mesmo” – é uma afirmação da década de 80 do astrônomo Carl Sagan.”
A ideia de que “somos todos poeira estelar”, talvez justifique como me marcam as experiências em planetários. Este senso de pertencimento me traz conforto e segurança para continuar explorando o mundo e pesquisando PESSOAS – hábitos, comportamentos e movimentos que movem a vida e a sobrevivência. Ao mesmo tempo, este mesmo senso de pertencimento, autentica a existência da singularidade, me desafiando a evoluir a partir da inquietude do que não conheço e, eventualmente, até mesmo do que nunca poderei conhecer.
Por que para você um bolo parece muito doce, enquanto para o outro, a dose de açúcar está perfeita?
De forma bem figurada, é mais ou menos através deste princípio de inquietude que podemos navegar por diferentes dimensões – sejam espaços físicos ou não -, encontrando nos pontos de semelhança conforto e, na diferença, a oportunidade de aprendizado através da aproximação da lente singular do outro e a construção de pontes através da expansão cocriativa.
Falar de criatividade é pontual, mas a cocriação é essencial quando enxergamos a evolução do movimento de descentralização do mundo e da economia orientada ao pertencimento – comunidade e colaboração. Protagonistas que movimentaram o curso da história revelam na fonte da sua criação, a relação com universos completamente diferentes: bebendo novas águas e as combinando, em uma alquimia única, com as próprias origens, estabelecem novas raízes – novas estruturas e comportamentos.
Ilustração do movimento da Economia da Paixão baseada em protagonismo, pertencimento e comunidade, extraída do relatório “CUIDAR”, produzido pelo laboratório da Economia da Paixão, o Inquietesi
A primeira exposição que destaca a relação de Yves Saint Laurent com o oriente, em curta temporada no Japão até dezembro de 2023, explora esta dinâmica. O designer buscou muito refúgio criativo no universo paralelo do oriente e foi responsável por popularizar cortes e formas desta esfera do mundo, as conectando de forma a honrar também as suas origens ocidentais. Esta capacidade de criar pontes e cocriar, diz muito sobre o sucesso e legado da marca que YSL fundou após trabalhar com Christian Dior.
“Trabalhar para o Christian Dior, foi para mim, a realização de um milagre. Tenho um grande respeito por ele, que me ensinou as raízes da minha arte.”
Sede de criatividade: um sinal da chegada de uma nova era econômica!
O despertar criativo vem chegando junto com este movimento de descentralização que rege uma nova era econômica baseada na inteligência regenerativa da natureza, na qual a criatividade é ferramenta individual e coletiva; disponível e abundante. A evolução de formas de viver mais orientadas à comunidade começa a aparecer através de manifestos crescentes da vontade de tornar o invisível, visível, explorando novos assuntos e experiências, se relacionando com novas pessoas, culturas e assim por diante.
Em últimos artigos aqui no blog do Fashion Revolution Brasil, compartilhei muito sobre os princípios desta nova era regenerativa e consciente, amplamente conhecida no mercado como “era digital”. Exploro a transição para esta era através da ótica da Economia da Paixão, o que também já introduzi em artigos anteriores que você pode revisitar:
- ECONOMIA DA PAIXÃO Qual é o seu propósito no mundo da moda?
- ALUGUEL E REVENDA Exemplos de modelos de negócios de moda ancorados ao movimento da Economia da Paixão
- MESMO SEM REFERÊNCIA, SEJA A REFERÊNCIA É o que ensina Néllys Côrrea, agente da Economia da Paixão, ilustrando os valores femininos que despertam a consciência sustentável, plano de fundo do movimento #QuemFezMinhasRoupas
- VOCÊ ESTÁ PROTAGONIZANDO A ECONOMIA DA PAIXÃO PARA PERTENCER A ERA DIGITAL? O convite para esta pergunta celebra a importância do questionamento “Quem Fez Minhas Roupas?” como um meio de conexão, a cura da era regida pela consciência
- TEMOS O QUE É NECESSÁRIO PARA A CRIAÇÃO DE UM MUNDO MAIS SUSTENTÁVEL? 66% dos cientistas da Organização Meteorológica Mundial acreditam que até 2027 podemos ultrapassar um novo limite do aquecimento global
- ECOANSIEDADE Precisamos falar de hábitos e crenças de moda e consumo que precisam ser regenerados para a cura de um sistema adoecido
CRIAMOS DESEJO PELO CONSUMO, AGORA, DEVEMOS CRIAR DESEJO PELA SUSTENTABILIDADE
Em uma das minhas últimas viagens deste ano, que exploro a “REGENERAÇÃO” como tema central da minha Jornada da Economia da Paixão, passei pelo Japão. Percorrendo as ruas de Shimokitazawa, um dos bairros vintage de Tóquio, com inúmeras lojas com ótimas descobertas culturais, reunindo peças tradicionalíssimas (algumas já apresentadas através do upcycling) e os mais diversos itens de revenda, me lembrava do conceito que ouvia há alguns anos na graduação de Publicidade e Marketing através da fala de diferentes professores fazendo referência ao atual e obsoleto modelo econômico: “CRIAMOS DESEJO PELO CONSUMO!” e, automaticamente, completava já traduzindo para a visão do modelo econômico regenerativo “AGORA, DEVEMOS CRIAR DESEJO PELA SUSTENTABILIDADE”.
Loja em Shimokitazawa, um dos bairros vintage de Tóquio. O Japão guarda a origem do streetwear, em ascensão no mundo da moda – o que se relaciona com dinâmicas comportamentais relacionadas a evolução da ocupação e vivência em centros urbanos. O streetwear tem tudo a ver com a cultura cíclica, atemporal e regenerativa de um país que sabe lidar com o fim para nutrir o começo. Isto porque o streetwear combina elementos tradicionais e contemporâneos e abre as portas para modelos de negócios da economia regenerativa, como a revenda.
E assim os princípios das economias regenerativas seguiram presentes nas estreitas ruas do Japão. A atmosfera de um país com tamanha força cultural, não só favorecem a visibilidade clara e prática dos fundamentos da regeneração, como trazem paralelos diretos com as potencialidades do nosso país, o Brasil, frente a esta transição de era.
Compartilhei alguns insights desta imersão no Japão em um material que te convido a visitar aqui, adiantando a seguir os itens deste conteúdo, que já entregam em seus títulos boas reflexões sobre os valores que sustentam a cultura de inovação pela ótica da ECONOMIA DA PAIXÃO e a mecânica de economias regenerativas:
- EDUCAÇÃO & RESPEITO
- A comunidade depende de pertencimento e o pertencimento nutre e é nutrido pelo protagonismo
- Visão de Propósito
- COMPROMISSO
- Aprendizado Constante
- A importância do belo na rotina
- Atemporalidade
- Laços e honra às origens e tradições
- SILÊNCIO
- Habilidade de foco
- As multidimensões da sensorialidade
- VÁLVULAS DE ESCAPE
- A arte de celebrar
- Ludicidade e irrealismo
- Surpresa, diversão e encantamento
- Tolerância e acolhimento a falha e ao erro
- CONSCIÊNCIA DE FIM
- Passado e futuro conectados ao presente
- Cultura vintage, revenda e upcycling
- IMATERIALIDADE & ESPIRITUALIDADE
- Culto e conexão à natureza
- Minimalismo: menos é mais
- RITUAIS
- Lógica de abundância
- Portais
- CUIDADO
- Reconhecendo o protagonismo de cada parte no todo
- Tudo começa de dentro para fora
- Hospitalidade
- BRASIL [e nosso baita potencial!]
- Não precisamos viajar para sair do lugar!
Paula Costa é Comunicóloga formada em Publicidade e Gestão de Varejo pela graduação e MBA da ESPM, com especializações complementares em inteligência de mercado, pesquisa, antropologia, futurismo e inovação e passagem por instituições globais como Hyper Island e Tel Aviv University. Baseada na Europa, transita por diferentes países e eventos de arte, design, tecnologia, inovação, negócios e varejo, realizando curadoria de comportamentos, movimentos e tendências, que se fazem insumos dos insights que compartilha em grupos globais de inovação, como LinkedIn Creator e apoiadora do Fashion Revolution Brasil, além de aulas de Pós Graduação e MBA de instituições como a ESPM, palestras, workshops, mentorias e consultorias de tendências, inteligência estratégica e inovação, baseada na visão da Economia da Paixão, tema do livro de sua co-autoria e foco do projeto de sua co-criação, o Inquietesi: laboratório da Economia da Paixão para a transição à Era Digital, regida pela Consciência.
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