Governança e Diversidade no Setor da Moda
por Regina Magalhães, para o Índice de Transparência da Moda 2022
A indústria da moda é uma das que apresenta maior impacto social e ambiental, além da sua grande importância econômica. Se por um lado, apresenta sérios problemas socioambientais, como poluição, geração de resíduos e diversos casos de trabalho escravo contemporâneo, tem, por outro lado, um enorme potencial de avançar em modelos de economia circular e na geração de empregos de qualidade, principalmente através das novas tecnologias da indústria 4.0.
Transformar um negócio que apresenta impactos negativos em um negócio de impactos positivos torna-se cada vez mais urgente e, fundamental destacar, mais possível e viável, podendo tornar o negócio mais competitivo. Essa não é uma mudança simples. Implica em sistemas de gestão mais sofisticados, capazes de monitorar continuamente toda a cadeia de valor, e que adotem novas tecnologias e modelos de negócios.
O setor carrega ainda uma grande importância cultural: seus consumidores buscam expressar suas identidades
de gênero, racial, cultural, orientação sexual, etc. por meio da moda, e esperam que as empresas sejam coerentes com o respeito e a valorização da diversidade. Compreender as mudanças culturais e comportamentais da sociedade e inseri-las nos produtos e no relacionamento com os consumidores é, hoje, fundamental para o sucesso empresarial.
Tais fatores representam aspectos estratégicos para as empresas e, portanto, devem estar sob a responsabilidade da governança corporativa. Estratégias, planos e investimentos que afetam os impactos sociais, ambientais e culturais devem ser decididos e monitorados pelo conselho de administração. É também papel do conselho integrar a agenda de sustentabilidade em todas as áreas da empresa, como desenvolvimento de produtos, finanças, relações com investidores, gestão de fornecedores, operações, marketing e gestão de pessoas.
O primeiro e mais importante papel do conselho é a definição da estratégia, ou seja, como as questões sociais, ambientais e culturais serão incorporadas ao negócio. Normalmente, as empresas tratam esses temas como riscos, mas podem ser considerados oportunidades de negócio, de diferenciação competitiva.
O segundo passo de um conselho é definir a materialidade social e ambiental da empresa: identificar os fatores que podem afetar o desempenho financeiro e o valor da empresa (materialidade financeira), assim como os fatores que podem gerar impactos socioambientais relevantes (materialidade do impacto). Cada empresa tem sua própria materialidade que depende das condições específicas do produto, do processo de produção, do modelo de negócio, do mercado onde atua e da sua cadeia de valor.
Definida a estratégia, o conselho então cria as condições na governança e na alta gestão para atuar de forma eficaz com essa agenda. Em primeiro lugar, profissionais com conhecimento profundo sobre os temas devem integrar o conselho, que pode ainda criar um comitê específico, com membros próprios e membros externos especialistas, para gerar análises consistentes e formular recomendações para tomadas de decisão.
“A governança é o que vai garantir uma estratégia competitiva, ética e sustentável.”
O conselho deve ainda ser capaz de entender o contexto do negócio e dialogar com os diversos stakeholders. Os contextos social, ambiental e cultural podem mudar rapidamente e surpreender uma gestão que não consiga se antecipar às transformações. Nesse sentido, a diversidade no conselho ajuda as empresas a identificar temas emergentes, a estabelecer estratégias de comunicação com diferentes públicos, a identificar novas demandas e desenvolver novos produtos. Ou seja, a diversidade é estratégica para os negócios em todas as suas dimensões.
Por fim, a criação de indicadores para monitorar o desempenho das empresas nos temas materiais é fundamental para orientar a gestão, definir investimentos e novos negócios, e fazer uma comunicação transparente. Incorporar esses indicadores aos mecanismos de incentivos e remuneração variável dos executivos é a forma mais eficiente para alinhar a estratégia da empresa com a gestão do negócio.
Ou seja, a governança é o que vai garantir uma estratégia competitiva, ética e sustentável. Porém, os dados desse Índice de Transparência da Moda Brasil 2022 mostram que a maioria das empresas tem ainda uma longa trajetória para criar uma governança adequada aos novos desafios, considerando que mais da metade das 60 empresas analisadas não divulgam informações sobre governança, apenas 22% têm programas de desenvolvimento de carreira para mulheres, 12% incorporam sustentabilidade aos critérios de remuneração dos executivos, e 28% divulgam quem é o membro do conselho responsável por direitos humanos e meio ambiente nos negócios.
Escrito por Regina Magalhães, Executiva Sênior em Vendas, Transformação Digital e Sustentabilidade
Texto retirado do Índice de Transparência da Moda de 2022.