Consumo consciente e o poder revolucionário da Geração Z
Taya Nicaccio*
Muitos são aqueles e os estudos que buscam entender como será o nosso comportamento e consequentemente o nosso consumo pós-pandemia – isso porque atualmente vivemos em um cenário pandêmico que já dura há cerca de 8 meses. De fato, em ‘história da moda’ aprendemos o quanto o tempo, o espaço, os acontecimentos e os impactos sociais refletem em nossa maneira de ser e vestir.
Fazendo uma analogia histórica entre o intitulado big concept, um grande conceito que se passa na segunda guerra mundial em meados dos anos 40, onde mulheres passam a assumir novas tarefas em tempos de militarismo, racionamento, clima de tensão, medo e tristeza, e entre o momento atual, uma pandemia mundial do covid-19 que obriga – uma parcela de pessoas privilegiadas – a adotarem um isolamento social, bem como uma quarentena que transformou o emocional, o físico, o comportamento, e principalmente o modo de consumir de bilhões de pessoas ao redor do mundo.
Antemão, consumo consciente não se restringe ao parar de comprar, tampouco, é sobre consumir excessivamente um produto de moda por ele ser “sustentável”, isto é, mesmo que um todo consuma produtos produzidos com menos impactos ambientais e ou peças de segunda mão, é essencial ser consciente e se questionar quanto a necessidade de adquirir determinado produto ou serviço. Mas afinal, o que é consumo consciente? De acordo com o Instituto Akatu, o seu principal propósito é mobilizar o consumidor para que ele seja consciente do seu poder transformador no ato consumo – que basicamente se resume em três fases – a compra, onde o consumidor pode escolher o produto, consumir ou não dessa empresa, e ainda assim, optar por outra rede; o uso, em que pode-se abraçar o poder de usar com mais ou menos cuidado, gastando mais ou menos energia, bem como outros recursos naturais; por fim e não menos importante, o descarte, nesta fase o consumidor tem o potencial de aderir o descarte correto e, dentro do contexto de moda e vestir, ele pode doar ou recorrer ao upcycling, evitando o volume de lixo, dos resíduos têxteis, da coleta de lixo e os custos ambientais.
Se em julho deste ano, segundo o levantamento do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas (FGV IBRE), a estimativa para as compras de final de ano era de adiamento de 55% da população brasileira, devido ao contexto pandêmico e do desemprego, hoje este cenário muda, pois há algumas semanas atrás tivemos um aumento no consumo, resultado este da última sexta-feira de novembro [black friday] e com a queima de estoque para as confraternizações de dezembro e para a chegada do verão. Entretanto, estes dados mudam quando consideramos em foco os jovens, especialmente os que compõem a Geração Z (nascidos entre 1995 e 2010), mais preocupados com causas sociais e impactos ambientais, e com menos poder aquisitivo também, considerando um levantamento feito pelo IBGE e Tendências Consultoria que representa um aumento de 41, 3% no desemprego entre as classes D e E. Os mesmos representam novas linguagens e comportamentos que influenciam diretamente os hábitos de consumo, como ainda, estão posicionados no topo da pirâmide de influência e, são aspiracionais para os mais novos e inspiracionais para os mais velhos.
Os estudos da WGSN, empresa britânica de previsão de tendências, apontam que a Gen Z pode ser reconhecida e celebrada por ser destemida e resiliente – e novamente o impacto que as mudanças na sociedade e na cultura digital podem alterar os estados emocionais desta geração – 75% das pessoas desta geração demonstram que o vírus impactou significativamente a forma em que enxergam o mundo, no mesmo compasso em que 68% dizem o mesmo sobre o movimento Black Lives Matter. Esses jovens têm o poder revolucionário de transformar o mundo ao seu redor, com a capacidade de usufruir dos espaços tecnológicos e das suas redes de comunicação para desconstruir autoridades e descolonizar pensamentos, assim como, defender toda causa ligada à identidade do próximo – gênero, orientação sexual, raça e classe – com um percentual de 63% (BOX 1824).
A Geração Z também pode ser vista como um nicho influenciado pelo ativismo que ganha cada vez mais força e notoriedade, como a Fridays For Future [Sextas pelo Futuro] que se deu início com a jovem ativista ambientalista de 17 anos, Greta Thunberg, quando decidiu sentar-se em frente ao Parlamento sueco, em Estocolmo, para cobrar políticas públicas e mudanças sistêmicas com o propósito de destituir a atual crise climática e o aquecimento global que afeta diretamente nós seres humanos e a Natureza. O jovem brasileiro acredita que pessoas podem transformar a sociedade quando se organizam em torno de uma causa – e eu também. Por isso, agora mais do que nunca é primordial que enquanto cidadãos, seguimos o embalo da esperança e do poder revolucionário transmitido pela Gen Z para termos um futuro próspero, justo e humano para todes.
As confraternizações deste Natal e o Ano Novo são incertas e totalmente diferentes de tudo que já vivenciamos, mas já estão batendo na porta e você pode repensar e adotar um consumo consciente que não seja fruto do impulso e não contribua para a superprodução, o hiperconsumo, o desperdício e os inúmeros fatores que impactam o meio ambiente. Ademais, é essencial que mudemos sistematicamente os padrões de produção e as grandes redes de fast-fashion, aderindo um consumo que de fato seja necessário e, engaje renda e trabalho para categorias menores também, como costureiras independentes, artesãos e pequenos empreendedores.
Deixo aqui três sugestões de documentários – duas que talvez sejam clássicos entre os estudantes de moda – para questionarmos e discutirmos como a indústria da moda realmente opera em condições trabalho e no impacto que gerado nas comunidades em que são produzidas nossas roupas. Para reverberar mudanças sistêmicas precisamos comunicar para além da nossa rede, para pessoas que não tenho acesso às mesmas informações que estão entre nós há tempos, então lá vai: The True Cost [do diretor Andrew Morgan], Estou Me Guardando para Quando o Carnaval Chegar [do diretor Marcelo Gomes] e I Am Greta [do diretor Nathan Grossam]. Te convido também para conferir a terceira edição do Índice de Transparência Moda Brasil, ‘uma ferramenta para nos ajudar como cidadãos, empresas, organizações e setor público a cobrar, investigar e implementar condições dignas e justas para trabalhadores e para a Natureza.’
Boas festas, fique em casa e se resguarde! 🙂
Arte: Nicoletta de la Brown
* Sou graduanda de Moda na Faculdade FMU/FIAM-FAAM, técnica em Modelagem do Vestuário, pela Etec Tiquatira. Atuo como uma jovem ativista, modelo, e no Instituto Fashion Revolution integro a equipe de Comunicação e o Comitê Racial.