Como as comunidades indígenas estão sendo afetadas pelo Covid-19

By Fashion Revolution

4 years ago

Este não é um texto sobre dados. Citando Milena Kokama “Nós não somos um número”.  Esse é um texto sobre vidas que foram roubadas, empatia e conscientização. A realidade é que poucos de nós sabemos o que realmente está acontecendo nas comunidades indígenas e por mais que tenhamos acesso a dados e notícias, essa população está sendo atacada de formas inimagináveis durante o COVID-19. 

“É mais do que um vírus, é um ataque cultural, um extermínio, que inclui o apagamento dos costumes tradicionais.” Milena Kokama 

Cada povo indígena possui seu ritual de acordo com suas tradições e o COVID-19 juntamente com o despreparo do Estado em atender os povos indígenas, causa inúmeras violências. Uma delas que virou notícia foi o fato de não permitir o velório, o enterro, o choro, com até mesmo crianças que morreram e desapareceram. É inaceitável, o desrespeito ao luto e a cultura de um povo, é preciso denunciar para que fatos parem de acontecer.

Os povos indígenas estão sendo agredidos de todas as formas e essa violação parte dos órgãos e do serviço público que deveriam defendê-los, além da falta de atendimento e remoção os deixando morrer a míngua, eles estão sendo enterrados em sepulturas coletivas. É o Estado destruindo sua tradição e os agredindo novamente. Nos hospitais e no cartório não é diferente, quando algum indígena recebe seu atestado de óbito está escrito “ pardo” sendo que ele não é pardo, ele possui sua etnia e ele não precisa de um registro administrativo dizendo quem ele é porque quem tem que recolhê-lo são suas lideranças tradicionais. É preciso ter direito de colocar no seu atestado de óbito sua etnia indígena para não apagar dos registros sua memória.  

Para o povo indígena o COVID-19, nunca matou só os idosos. No terceiro óbito, a vítima foi um jovem de 15 anos do povo yanomami de Roraima. Seguido da morte de crianças de 1 ano, de 8 meses e da violação do Estado ao tirar essas crianças de suas mães, sem considerar que cada povo tem seu ritual conforme suas tradições. A naturalização da morta indígena pelo COVID-19 com o despreparo do setor público não permite o velório, o enterro, o choro, então essas crianças morreram e desapareceram, o que é inaceitável, desrespeita o luto e a cultura de um povo, é preciso denunciar para que fatos como esse continuem acontecendo e para que devolvam as crianças as suas mães. 

 Mais uma agressão diária, está no discurso do Presidente, usando frases como “só morreria velhinhos”, em que reforça a ideia de por serem idosos teriam menos direito e isso recai com mais força sobre a cultura indígena, já que este é um ponto de distinção, pois suas lideranças são os anciões. Segundo Sônia Guajajara, os indígenas não perdem espaço quando eles vão ficando idosos, ao contrário, mais eles tem um lugar especial, mais eles tem um lugar de cuidado para garantia da nossa identidade, da nossa cultura, da nossa sabedoria, garantir que eles repassem o conhecimento para os nossos jovens porque eles são a biblioteca viva de conhecimento, são nossos tesouros vivos, tememos muito a perda deles e infelizmente já vamos perdendo muitos, foi absurda a perda de nossos tambuí, avós, donos da nossa sabedoria. Deixar os velhinhos morrer é no mínimo a autorização do genocídio. A afirmação de vivermos num governo genocida se revela em suas frases, atitudes, a maior parte das mortes não se deu somente pelo vírus, foi pela própria autoridade máxima do país com a flexibilização e relativização muito grande dos cuidados, desrespeitando e desconsiderando toda a riqueza que tem essas pessoas. 

As comunidades indígenas são as defensoras da nossa floresta. 

No momento, existe uma mobilização política parlamentar para a execução do Plano Emergencial de Enfrentamento à COVID-19 nos Povos Indígenas, Comunidades Quilombolas e Povos e Comunidades Tradicionais, considerando também do ponto de vista biológico que estes são os mais suscetíveis à contaminação e morte por coronavírus. A busca é que este plano seja imediatamente implementado, porém é inadmissível que no dia 08 de junho o Presidente tenha vetado trechos essenciais do Plano Emergencial.  Segundo a Deputada Federal Joenia Wapichana “é inadmissível que, passados ​​520 anos, os povos indígenas nesse país continuem sendo feridos e seus direitos fundamentais, como o direito à própria vida, negados.”

O que podemos fazer?

  1. Doe: existem várias campanhas de apoio financeiro para apoiar os povos indígenas, inclusive a Nacional da APIB – Associação dos Povos Indígenas do Brasil. 
  2. Comprometa-se a conhecer indígenas, ouvir os que estão no dia-a-dia dessa luta, rompendo sua zona de conforto para ter um panorama além das informações que chegam até você. Dê visibilidade e compartilhe informações diretas dos povos indígenas;   
  3. Questione os deputados federais, os senadores, os órgãos públicos que estão sendo subvertidos pelo governo para interesses de criminosos, o Presidente. E também questione e exija posicionamentos claros aos prefeitos e governadores em prol dos povos indígenas da sua região; 
  4. Compartilhe essas informações para que mais pessoas se conscientizem e busquem informações sobre os povos indígenas da sua região;  
  5. Estude sobre a cultura e a causa indígena; separei referências de livros de lideranças, canais, ONGs, entre outras maneiras de ter acesso a essas informações. 

Canais de informação: Apib | GreenpeaceSite da Emergência Indígena Observatório COVID19 Indígena

Livros: Pierre Clastres – Arqueologia da Violência; Darcy Ribeiro – Maíra; Mércio Gomes – Os índios e o Brasil; 

Cesar Gordon – Economia Selvagem; Davi Kopenawa e Bruce Albert – A queda do céu: palavras de um xamã yanomani. 

Entrevista:  Pandemia e o Genocídio Indígena, com Sonia Guajajara.

 

“Precisamos valorizar a relação com a mãe-terra, ela está gritando e grita outra vez porque ela está sangrando.” Sonia Guajajara

 

Por Patricia Zanella, cofundadora da Ecociclo