A comunicação como ponte para a sustentabilidade
por Julia Codogno*
A comunicação aliada a uma comunidade mais engajada em prol da sustentabilidade.
Falar sobre sustentabilidade não é uma tarefa fácil. Demanda estudo, análise, autocrítica, desconstrução de tudo que pensamos saber, uma boa dose de resiliência e muita vontade de mudança.
Um tema que, apesar de um tanto quanto corriqueiro nos dias atuais, facilmente encontrado até mesmo pelos extensos corredores de supermercados, grandes redes farmacêuticas, comerciais de instituições financeiras e em intocáveis campanhas do mundo da moda, parece ser pouco compreendido por grande parte da população.
Segundo uma pesquisa realizada pelo Instituto Akatu em 2018, que teve como objetivo analisar o panorama do consumo consciente no Brasil, estamos no momento de recrutar consumidores em nível ainda iniciante para o caminho do consumo sustentável, ou seja, precisamos interagir (mais e melhor) com pessoas que possuem pouco, ou nenhum conhecimento sobre o tema. O estudo foi feito por meio de entrevistas, com cerca de 1.090 pessoas, advindas de diversas regiões do país, de diferentes classes sociais ou acessos culturais a fim de analisar a evolução do grau de consciência dos brasileiros e seu comportamento de consumo. Traz também indicações de quais são os principais desafios, motivações e barreiras para a adoção de práticas inclinadas ao consumo mais consciente.
A seguir vamos analisar algumas respostas sobre o conhecimento do termo sustentabilidade:
- 68% dizem já ter ouvido falar em sustentabilidade;
- 61% não sabem dizer o que é um produto sustentável;
- 11% dizem não saber ao certo o que é sustentabilidade;
- 61% dos entrevistados acreditam que o conceito está relacionado somente ao meio ambiente.
Entre as principais barreiras para a implementação de práticas mais sustentáveis às suas rotinas estão: resistência/dificuldade quanto ao preço; dúvidas sobre a qualidade ofertada; falta de disponibilidade – de acordo com a periodicidade; não encontrar um produto equivalente ao que costuma usar e/ou por ser menos bonito/atrativo que um tradicional.
Esses e outros dados – que podem ser acessados aqui – demonstram que fatores como conhecimento e confiança ainda são pouco explorados por parte de marcas e negócios que se destinam a criar produtos mais sustentáveis.
De acordo com o Índice de Transparência, outro importante relatório para entendermos tal cenário – disponibilizado pelo movimento Fashion Revolution – apenas 15% das empresas analisadas durante a pesquisa divulgam como investem em soluções para a circularidade, ou seja, buscam ações que promovam produções mais responsáveis e de impacto positivo (entenda mais sobre o conceito aqui). Número muito abaixo do que seria o ideal diante de uma produção global de, aproximadamente, 150 bilhões de novas peças de roupa ao ano (Massachusetts Institute of Technology – MIT). Ou seja, além de pouca implementação de melhores práticas, também notamos pouca divulgação do que é já é realizado por empresas do setor.
Compreendendo que existe uma grande necessidade na busca por melhores diálogos para uma comunicação que possibilite maior receptividade e coparticipação de novas pessoas, já é possível encontrarmos pela rede técnicas e ferramentas que podem auxiliar nesta jornada. Afinal, conhecimento é a ponte para a sustentabilidade que tanto queremos (e precisamos!) ver acontecer.
O documento “Diretrizes para o Fornecimento de Informações sobre a Sustentabilidade dos Produtos” – criado em uma parceria entre a Organização das Nações Unidas para o Meio Ambiente e o Instituto Akatu é um material que pode facilitar o caminho de quem empreende sob a lente da sustentabilidade, mas ainda não sabe ao certo como dissertar sobre o tema. Uma espécie de passo a passo para a criação e o compartilhamento de informações referentes ao produto ou serviço que será comercializado.
No livro “Como fazer amigos e influenciar pessoas”, Dale Carnegie (1936) discorre diversas reflexões acerca de como podemos melhorar nossa relação interpessoal: por meio de técnicas e direcionamentos que conduzem a uma escuta ativa e mais afetuosa que abrem espaço para discussões mais produtivas. Dale Carnegie propõe instrumentos que possibilitam a influência da fala e provoca o coletivo à ação. Nos relembrando sobre a premissa básica de toda e qualquer comunicação: a de que ela só existe se quem está do outro lado pode nos compreender. E, caso isso não seja possível, é quem fala que precisa rever os meios pelos quais está tentando levar adiante suas intenções.
A fim de facilitar esse processo, também podemos orientar nossa conversa por meio de 3 conceitos essenciais: transparência, engajamento e educação.
TRANSPARÊNCIA: Tão bom quanto realizar ações mais positivas, é contarmos sobre elas. Por meio do que já pode ser implementado em marcas ou negócios e (também) aquilo que ainda não é possível praticar. Explicando sobre processos e objetivos perante a sustentabilidade;
ENGAJAMENTO: Engajando e fortalecendo toda uma comunidade. A partir da criação de conteúdos que falem sobre sustentabilidade, permeando nosso universo de atuação;
EDUCAÇÃO: Educando a respeito de informações ainda pouco difundidas, como: certificações, materiais utilizados, processos realizados, formas corretas de uso e descarte entre outros fatores.
Inspirar pessoas a refletirem e transformarem suas rotinas pode parecer uma atividade difícil. Principalmente em meio a um momento de tamanho caos e desalento, no qual a esperança parece se tornar distante demais para que possamos conduzir conversas mais otimistas, empáticas ou até mais positivas. Mas, como disse Paulo Freire: “Esperança é verbo de esperançar, não de esperar. Esperança não é sobre esperar que algo aconteça. É sobre saber se organizar para fazer com que as coisas aconteçam”. Em seu livro “Pedagogia da Autonomia: Saberes necessários à prática educativa”, Paulo Freire cita que: “…para que haja ensino, é preciso haver alegria e esperança…” E o que seria da comunicação se não fosse uma das mais incríveis formas de educar? (Esse trecho foi inspirado no vídeo disponível no canal Tempero Drag).
Portanto, é emergencial incorporar ao nosso discurso construções mais coletivas e inclusivas, que sejam capazes de perfurar nossas resistentes bolhas sociais.
Comunicação é o começo, o meio e o fim de todo processo que se propõe a expandir conhecimento e possibilitar novas (e melhores) formas de vivermos em sociedade.
*Imagem: Natalya Vaitkevich para Pexels
Fonte: Instituto Akatu | ONU | MIT | Fashion Revolution | Fundação Elle MacArthur | McKinsey & Company | Business of Fashion | Tempero Drag.
Sobre a autora:
Julia Codogno – é professora de moda e criadora de conteúdo sobre moda e sustentabilidade. Também criou um guia online que reúne mais de 200 marcas com iniciativas de impacto positivo. Acompanhe @juliacodogno!