Depois do Rana Plaza

By Fashion Revolution

9 years ago

By Bruna Miranda

A primeira vez que ouvi falar do fotógrafo Ismail Ferdous foi no ano passado, próximo ao primeiro Fashion Revolution Day, quase um ano depois do desabamento do complexo de fábricas têxteis Rana Plaza, em Dhaka, Bangladesh. Ele registrou, em imagens marcantes e chocantes, a tragédia contida em cada parte dos escombros em sua terra natal, que foram parar no vídeo The Deadly Cost of Fashion (O Custo Mortal da Moda), do New York Times, e também em um protesto durante a Semana de Moda de Nova York, Outono/Inverno 2014/15, na mesma época. Suas fotografias foram projetadas no exterior do Lincoln Center, onde acontecia o evento, para revelar e destacar o lado desumano da moda exatamente quando todas as atenções estão voltadas para as passarelas.

Agora é no instagram, com a série After Rana Plaza (Depois do Rana Plaza) que Ismail continua registrando e colaborando para a sensibilização em torno das necessidades de melhorias na vida dos trabalhores dessas fábricas têxteis exploratórias de Bangladesh. Ele explica: “Esse projeto veio de um lugar muito pessoal. Como minha base é Bangladesh, vivo entre as pessoas que são afetadas pela indústria do vestuário. Todos os dias, pela manhã, na rua em frente à minha casa, vejo centenas de trabalhadores indo para as fábricas. Eles são um constante lembrete do colapso”.

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Diariamente, ele entrevista um sobrevivente ou um membro da família de uma das 1.110 pessoas que morreram no acidente. Cada foto é acompanhada por um curto depoimento de áudio em bengali (língua falada em Bangladesh), traduzido em texto para o inglês e anexado na legenda da imagem. O fotógrafo escolheu o instagram porque ele quer que essas histórias tornem-se parte da vida cotidiana das pessoas. “Eu acredito que o instagram é uma fonte de ferramentas educacionais e de informação e que também pode envolver pessoas de diferentes idades, nacionalidades, etnias e classes socioeconômicas. Traz todas as questões para bem perto de nós”, analisa.

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Legendas de áudio: “Eu nunca pensei que meu filho iria morrer assim. Eu nunca pensei que ele seria desintegrado até a morte; que eu teria que recuperar seu corpo de um prédio de nove andares que lhe esmagou. Nunca pensei que isso poderia acontecer. Nunca poderia ter acreditado que meu filho iria morrer tão jovem”, diz Rahela Begum, cujo filho de 13 anos filho morreu durante o colapso. História: “Meu filho tinha muitos sonhos para si e para nós. Ele prometeu que iria melhorar a nossa condição no futuro. Mas meu filho foi para algum lugar de onde ele nunca vai voltar. Meu filho gostava muito de mim. Durante o inverno, ele nos daria o cobertor e ficaria no frio. Mas ele nunca se queixou. Ele sempre dizia que ele não precisava de nada além de se preocupar com a gente. Na noite antes do 24 de abril, ele voltou do trabalho e me deu o que jantar. Eu estava muito doente e ele fez a minha cama e me colocou para dormir. Ele nos contou sobre as rachaduras dentro do Rana Plaza e que havia a possibilidade de colapso do edifício. Mas eu não prestei atenção a isso. Se eu soubesse que esse colapso iria acontecer, eu nunca teria deixado ele ir trabalhar naquele dia, não importa quanto dinheiro alguém me oferecesse. Na manhã seguinte, quando ouvi que o edifício Rana Plaza havia desmoronado, eu corri em direção a ele da nossa casa. Quando vi que o prédio havia desmoronado completamente, não conseguia descobrir o que fazer. Pedi a um cara na minha frente para me dar seu telefone para que eu pudesse chamar o meu filho mais velho. Pelos próximos três dias, nós procuramos por ele em todos os lugares possíveis, mas não conseguimos encontrá-lo. Fomos para todas as clínicas ao redor tantas vezes, mas não havia sinal dele. No dia 27 de abril, pela manhã, fomos para o Hospital Enam porque ouvimos que as vítimas dos 4º e 5º andares do Rana Plaza haviam sido resgatadas naquele dia. Mas ele não estava lá”.

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O projeto, financiado em parte pela Embaixada da Holanda em Bangladesh, vai durar um ano, até o próximo aniversário do colapso, em 24 de abril de 2016. “Através dessas histórias, as pessoas vão perceber como as vidas desses trabalhadores mudaram, quais os desafios que continuam a enfrentar e o que pode ser feito para ajudar no processo de recuperação”, finaliza Ismail.

Acompanhe no instagram: @afterranaplaza | @ismailferdous